Beliche

Acordei e nem sei; duas dúzias de pílulas e alguns cigarros; nada escapa ao controle, exceto tudo; Tento descer do beliche e dou de cara no chão. Tudo gira e sento na cama debaixo da minha e acabo deitando nela. Cochilo por mil anos e quando acordo já está escurecendo. Fico de pé e vejo pelo reflexo do espelho que agora consigo ver minhas costelas, como se eu estivesse vestindo uma armadura; só que eu não sou mais super-herói; talvez nunca devesse ter sido, mas eu achei que sim; que tinha um super poder por ser uma pessoa boa. Não. Não interessa muito se você é bom ou mal quando você sente que o chão está afundando e te levando junto com ele para um universo paralelo, cor de chumbo e que chove gotas salgadas; gosto de lágrimas. Enquanto encaro meu reflexo fico lembrando que é só eu girar a maçaneta e fugir dali; “Não custa nada ser feliz.” Alguém diz, e eu sangro pelos orifícios de raiva dessa frase. Eu não quero a felicidade do Prozac e nem inventar felicidades que não sejam minhas, do meu coração. Persisto. Chego perto do espelho e vejo que o lado esquerdo do meu rosto está inchado e meu braço esquerdo está formigando. E daí? Se tudo acabasse hoje eu não me importaria. Perigo. Quando se está disposto a pagar para ver: O que tem do outro lado? Lembro que me ensinaram a confiar em Deus e tudo daria certo; errado. Nem sei o que isso significa. Há dez anos eu ando pela vida tateando o caminho, agachado, com medo de abrir os olhos e descobrir que a vida deveria ser vivida em plenitude, sem usar muito a razão para entendê-la. Levo minhas mãos ao rosto e choro de soluçar; um choro estranho, cansado e de incompreensão. Deito no chão gelado e espero. A noite chega e lá fora ouço as vozes de pessoas que moram comigo, mas que deixaram de me procurar; cansaram e eu as compreendo. Hoje eu não comi nada e não senti falta. Escalo as escadas do beliche e me afogo na cama mais uma vez. No meio da madrugada, acordo sentindo meu rosto latejar e meu braço formigar. Com muito esforço, alcanço a escada e desço. Vou até a escrivaninha, apalpo meu rosto e começo a escrever: “Acordei e nem sei; duas dúzias de pílulas e alguns cigarros...”








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