Maquinário Distópico - Odisseia Improvável

Através da janela vi milhares de pessoas. Cada uma voava em uma direção; Esfreguei os olhos, tentando fugir daquela cena e quem sabe acordar em uma manhã ensolarada, com cheiro de canela e café, alguns pássaros cantando e  sem que nada de cinza com dez andares tapasse a minha visão do Sol. Esfreguei, esfreguei; tanto que fiquei cego. Arruinei meus globos. Os afundei dentro da minha cavidade e eles foram parar dentro da minha alma, que fica entre o coração e não sei o quê. Voltei a deitar e agora eu conseguia enxergar dentro da minha alma. Parecia um turbilhão. Um milhão de pessoas falando ao mesmo tempo, tentando vender a fórmula secreta do amor e da felicidade. Desejei apertar meus olhos foragidos só para calar todas aquelas pessoas que insistiam em me convencer que tinham o gabarito da vida. Eu não os alcançava. Não se pode pegar a alma; ela não é daqui. Veio de um outro lugar e tudo indica que ela volte pra lá. Tive uma ideia! Bisbilhotei pela janela, novamente e senti o cheiro de um rio que passa, todos os dias pela manhã, do lado do meu prédio. Mesmo cego, aquele cheiro de chuva era inconfundível. Fui tateando, até achar a fechadura da janela. Com algum esforço, achei e a abri. As pessoas que estavam voando, começaram a gritar: "O que você está fazendo? Sai daí! Não desista!" Eu respondi: - "Alguém me leva até aquele rio que passa por aqui todas as manhãs! Estou sentindo o cheiro dele!" Ouvi aquelas vozes gargalhando e zombando: "Não é um rio, aquilo são as lágrimas do Céu!" Eu tive outra ideia! Voltei para a cama, sentei, ainda com meus pijamas do Batman, pensando em vomitar meus globos para eu poder enxergar de novo. Pensei comigo: "Como se vomita a alma?" Comecei a andar de um lado pro outro e, subitamente, percebi que eu precisava chorar. Pensei em tudo o que eu tinha sofrido naquele ano, era dia 12 de Outubro, e tinha acabado de resolver um caso no dia seguinte. Pensei nele. Apaguei as luzes do quarto para não ouvir o cheiro ruim daquela luz amarela e quente. Abracei-me e entrei num processo de encolhimento. Chorei até ficar do tamanho de uma formiga e senti-me rasgar a alma ao meio. Meus olhos caíram dentro da minha boca e eu os coloquei para fora. Fiquei ainda mais uma hora para me recuperar da lamentação. Quando abri as pálpebras, coloquei meus globos oculares no lugar. Com a cama alagada, vi o quanto o dia estava lindo e claro. Senti  o cheiro de café com canela e pães assando. Ouvi alguns pássaros cantando e nada mais impedia o Sol de brilhar. Duas pessoas abriram a porta e vieram me abraçar, dizendo: "Já passou... a crise passou... estamos aqui!" Eram dois robôs, desgastados, com olhos incrivelmente tristes. Eles pegaram meu dedo polegar e o ligaram na tomada. Senti meu corpo se energizar; Levantei e minha visão foi sintonizando como se estivesse sendo sintonizada com a realidade correta. Nem lá, nem cá; agora eu tinha voltado à Terra correta. Tudo ficou cinza, num cenário pós-apocalíptico! Olhei meu reflexo no espelho e lá eu estava; metade máquina, metade homem. 

"Venha, temos muito o que te contar..." - Disseram as máquinas, me pegando pelo braço. 

                                  


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